Pesquisadores do Brasil e da Espanha conseguem isolar compostos presentes no sansão-do-campo (Mimosa caesalpiniifolia) – planta do Cerrado também conhecida como cerca-viva –, que combatem duas espécies de Candida, fungo que provoca a doença em humanos
Os fungos do gênero Candida causam uma doença bastante comum em humanos, a candidíase ou monilíase. Em pessoas com baixa imunidade, principalmente em ambiente hospitalar, a infecção pode ser mortal. Embora o medicamento mais usado para combatê-la seja eficiente em grande parte dos casos, algumas variedades do patógeno apresentam resistência.
Agora, pesquisadores do Brasil e da Espanha conseguiram isolar compostos presentes no sansão-do-campo (Mimosa caesalpiniifolia) – uma planta do Cerrado também conhecida como cerca-viva – que combatem duas espécies de Candida.
A ideia é criar uma pomada que possa ser usada como alternativa ao fluconazol, antimicótico há mais de duas décadas considerado a melhor alternativa contra a candidíase. A infecção pode causar coceira e dor nos órgãos genitais, além de pequenas feridas (em homens) ou corrimento (nas mulheres).
A pesquisa
Resultados da pesquisa foram publicados no Journal of Natural Products. A investigação foi conduzida durante o estágio de pós-doutorado de Marcelo José Dias Silva, no Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (IB-Unesp), em São Vicente. Parte foi desenvolvida durante o período em que o pesquisador passou na Universidade de Cádiz, na Espanha, também com bolsa da FAPESP.
O trabalho integra o Projeto Temático “Fitoterápicos padronizados como alvo para o tratamento de doenças crônicas”, coordenado por Wagner Vilegas, professor do IB-Unesp. O grupo também contou com financiamento do Ministério da Economia, Indústria e Competitividade da Espanha.
“A descoberta e o desenvolvimento de novas entidades terapêuticas, que com uma combinação apropriada permitem uma considerável redução na concentração necessária dos medicamentos, podem minimizar os efeitos colaterais e a toxicidade observada nas drogas usadas atualmente”, disse Vilegas, coordenador do estudo.
“Além disso, podem diminuir o custo final do tratamento e a resistência adquirida por alguns microrganismos. Nesse contexto, mais estudos são necessários, tanto de prospecção, como esse, como usando modelos biológicos”, disse.
Pomada
Foram isolados do extrato do sansão-do-campo 23 compostos conhecidos, além de cinco novos flavonoides nomeados mimosacaesalpina A, B, C, D e E. Aplicados em amostras de Candida glabrata e Candida krusei, duas espécies causadoras de candidíase, quatro dos 28 compostos mostraram atividade antifúngica maior que a do fluconazol.
“Nós aplicamos os diferentes compostos nesses dois fungos e a maior parte teve pouco ou nenhum efeito. No entanto, quatro deles mostraram atividade promissora e serão testados na forma de pomada”, disse Silva, primeiro autor do artigo.

Imagem microscópica do fungo Candida glabrata. Foto: DoctorFungus
Serão estudadas três formulações, usando os compostos ou combinações que tiveram maior efeito inibidor do crescimento dos fungos. Uma será a combinação de um tipo de beta-sitosterol com galato de etila, duas substâncias presentes em várias espécies de plantas, mas encontradas em abundância no sansão-do-campo.
A outra pomada terá apenas um dos novos flavonoides descobertos, a mimosacaesalpina C. Por fim, será testada uma combinação desta mimosacaesalpina com o beta-sitosterol.
“Sozinho, o beta-sitosterol não foi eficiente, mas combinado aos outros dois compostos mostrou um efeito sinérgico, com ação potencializada. Já a mimosacaesalpina C mostrou uma atividade promissora e seletiva contra o C. krusei, resistente ao fluconazol”, disse Silva.
Antes de chegar às formulações candidatas a se tornarem um medicamento, no entanto, os pesquisadores fizeram o extrato das folhas de sansão-do-campo, que foi submetido a um fracionamento por cromatografia – técnica de laboratório para fazer a separação de misturas.
Resultados promissores
No total, foram feitas cinco frações que, em seguida, foram testadas quanto à sua ação antifúngica. Três tiveram a melhor atividade, inibindo o crescimento dos fungos em 50%. Essas frações mais promissoras foram novamente fracionadas pela mesma técnica, desta vez isolando os novos flavonoides e os outros compostos.
“O extrato do sansão-do-campo é muito complexo. Contém muita clorofila e ácidos graxos, que dificultam a identificação dos compostos presentes. Graças à parceria com a Universidade de Cádiz, conseguimos fazer a separação e direcionar a pesquisa para as frações mais viáveis”, disse o pesquisador.
Antes de criar a pomada, no entanto, os pesquisadores vão testar se o efeito antifúngico dos quatro compostos se mantém, ou mesmo aumenta, quando eles são misturados com adjuvantes, substâncias usadas para potencializar a ação de medicamentos no organismo.
O artigo Bioassay-Guided Isolation of Fungistatic Compounds from Mimosa caesalpiniifolia Leaves (doi: 10.1021/acs.jnatprod.8b01025), de Marcelo J. Dias Silva, Ana M. Simonet, Naiara C. Silva, Amanda L. T. Dias, Wagner Vilegas e Francisco A. Macías, pode ser lido em: https://pubs.acs.org/doi/10.1021/acs.jnatprod.8b01025.