Setor enfrenta juros altos, margens pressionadas e busca alongamento de prazos; pequenos produtores são os menos afetados (Foto: MFarcello Casal Jr/Agência Brasil/Arquivo)
O financiamento ao agronegócio brasileiro atravessa um novo ciclo, marcado pelo aumento da inadimplência, mudanças nos prazos médios de crédito e pela consolidação da Cédula de Produto Rural (CPR) como mecanismo essencial de garantia.
O cenário reflete não apenas a deterioração das condições macroeconômicas, mas também uma transformação estrutural nas formas de acesso a recursos financeiros no campo.
Dados da CNDL/SPC Brasil mostram que a inadimplência entre pessoas jurídicas do setor subiu de 0,60% para 0,76% em março deste ano, uma alta de 26,7% na comparação anual.
“As operações de crédito rural com recursos direcionados e taxas de mercado foram as mais impactadas pela deterioração da capacidade de pagamento”, afirma Israel Malheiros, COO da Vertrau, empresa de especializada em para crédito agro.
“Esse quadro reflete um ambiente macroeconômico ainda desafiador, marcado por juros elevados, queda da renda agrícola e recomposição de margens após ciclos de investimento intensivo”.
O novo ciclo do crédito rural também é evidenciado pelo alongamento dos prazos médios de concessão.
De acordo com o Banco Central, o prazo total passou de 19,41 meses em abril de 2024 para 31,92 meses no mesmo mês deste ano – um aumento de 64%. Nas operações com taxas reguladas, o salto foi ainda maior: de 25,13 para 48,15 meses, alta de 92%.
“Essa mudança estrutural aponta para concessões mais longas, em resposta à necessidade de refinanciamento e à complexidade dos investimentos produtivos, sobretudo em maquinário e recuperação de áreas”, observa Malheiros.
Neste contexto, a CPR vem ganhando protagonismo como título de garantia e ferramenta de gestão de risco.
Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), o estoque de CPRs movimentadas cresceu 43% em doze meses, atingindo R$ 325 bilhões em março. Desde 2021, o volume registrado saltou de R$ 34 bilhões para R$ 484 bilhões, um crescimento de 1.323%.
Inadimplência estável entre produtores pessoas físicas
Apesar da alta na inadimplência entre empresas, os dados da Serasa Experian indicam estabilidade entre os produtores pessoas físicas.
A inadimplência rural geral ficou em 7,6% no último trimestre de 2024, mantendo-se estável em relação ao trimestre anterior e com leve alta de 0,8 ponto percentual na comparação anual.
“O cenário de estabilidade da inadimplência no agro brasileiro no último tri de 2024 reflete, principalmente, o aperto da política de crédito dos credores e a resiliência de grande parte do setor – que mesmo com desafios de custos e de perdas, segue honrando seus compromissos”, avalia Marcelo Pimenta, head de agronegócio da Serasa Experian.
“Além disso, modelos preditivos aplicados em ferramentas de análise e gestão de risco, como o Agro Score, e um mercado mais criterioso sobre a tomada de recursos financeiros, acabam também por reduzir a negativação”.
A inadimplência varia conforme o porte dos produtores: entre os pequenos, foi de 6,9%; entre os médios, de 7,2%; já os grandes produtores registraram 10,2%. Arrendatários e grupos econômicos sem registro rural apresentaram índice de 9%.
No recorte regional, o Sul do país apresentou a menor inadimplência, de 5,1%. Já o chamado “Norte – Agro” — que inclui o Norte do país, exceto Rondônia e Tocantins, e o noroeste do Maranhão — teve o maior índice: 11,3%.
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Fontes: Vertrau e Serasa Experian