Com o frio propício ao consumo e o manejo adequado dos vinhedos, o inverno na Serra Gaúcha reafirma a importância da tradição vitivinícola e da valorização dos produtos da agricultura familiar gaúcha (Foto: Rejane Paludo)
Com o frio característico do inverno, cresce o interesse por produtos coloniais como vinhos e sucos de uva, especialmente os produzidos de forma artesanal. Na Serra Gaúcha, região que concentra grande parte da produção vitivinícola do país, a safra 2024/2025 registrou crescimento de 5% em relação a uma colheita considerada “normal”, alcançando 860 mil toneladas de uvas.
A produção de uvas na região ocorre entre novembro e março, de acordo com a variedade. Durante os meses mais frios, as videiras entram em dormência, fase em que não produzem frutos. Esse período, no entanto, é crucial para o preparo do próximo ciclo.
“Durante o inverno, são feitos os tratamentos nas videiras. No final da estação, realiza-se a adubação do solo. Já em julho e agosto, é feita a poda seca, que ajuda a eliminar o excesso de ramos”, explica o enólogo da Emater/RS-Ascar, Thompsson Benhur Didone.
O inverno é, portanto, um momento estratégico para o manejo dos parreirais. A adoção de Boas Práticas Agrícolas (BPA), como a escolha de mudas certificadas, preparo do solo e a técnica da poda dupla, contribui para o bom desenvolvimento das videiras e eleva a produtividade nas safras seguintes.
Segundo levantamento da Emater/RS-Ascar em 55 municípios — incluindo os 49 da região de Caxias do Sul e outros seis das regiões administrativas de Lajeado e Passo Fundo —, das 860 mil toneladas colhidas, 745 mil foram destinadas à transformação industrial, 15 mil ao uso doméstico e 100 mil ao consumo in natura.
Tradição e qualidade
A vitivinicultura na Serra Gaúcha começou há 150 anos com os imigrantes italianos. Embora as primeiras cepas europeias não tenham se adaptado ao clima local, variedades americanas trazidas posteriormente pela cidade de Rio Grande prosperaram.
A partir das décadas de 1920 e 1930, a produção ganhou escala, inicialmente para consumo próprio e depois comercial, com o vinho sendo enviado a granel de trem para São Paulo.
O setor passou por uma transformação a partir dos anos 1990, com a modernização das vinícolas e o cultivo de variedades viníferas. A produção de sucos de uva também cresceu a partir dos anos 2000, junto com a de vinhos finos e espumantes, que hoje são reconhecidos nacional e internacionalmente pela qualidade.
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Valorização dos produtos coloniais
Nos últimos anos, os vinhos coloniais ganharam força no mercado, especialmente após a criação da Lei do Vinho Colonial (Lei nº 12.959/2014), que facilitou o registro de pequenas vinícolas e ofereceu vantagens fiscais. A legislação permitiu que agricultores formalizassem seus produtos sem a necessidade de abrir uma empresa ou obter CNPJ.
De acordo com Didone, esse modelo fortalece o vínculo entre produtor e consumidor. “Pequenas vinícolas costumam manter uma relação de proximidade e confiança com o consumidor final, transmitindo, não apenas o produto, mas também a história da família, o conceito do vinhedo e o valor do trabalho no campo.”
A Emater/RS-Ascar oferece suporte técnico a esses empreendimentos, inclusive no acesso ao Programa Estadual de Agroindústria Familiar (Peaf), que fornece orientação e serviços gratuitos ao produtor.
Segurança e boas práticas
A regularização dos produtos, como explica Bruna Bresolin, engenheira de alimentos da Emater/RS-Ascar, é feita pelo Ministério da Agricultura e Pecuária, por meio do Sistema Integrado de Produtos e Estabelecimentos Agropecuários (Sipeagro).
“O consumidor deve sempre priorizar produtos formalizados. No caso dos vinhos e sucos, é importante verificar no rótulo o número de registro no Ministério da Agricultura. Isso garante que o produto foi elaborado seguindo as Boas Práticas de Fabricação (BPF) e está seguro para o consumo”, orienta.
As BPF exigem cuidados rigorosos com a higiene das instalações, dos equipamentos e dos manipuladores, além do controle de qualidade da matéria-prima, rastreabilidade dos lotes e armazenamento correto.
“Esses cuidados são fundamentais não apenas para atender às exigências legais, mas principalmente para garantir um produto seguro, valorizando o trabalho do agricultor familiar e fortalecendo a confiança do consumidor”, ressalta Bruna.